terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Os crimes do narcoestado peruano

Por Leonardo Wexell Severo, de Lima-Peru

Passada a sangrenta ditadura de Alberto Fujimori e o estelionato eleitoral de Ollanta Humala, o povo peruano enfrenta agora o desgoverno de Pedro Pablo Kuczynski (PPK) e um parlamento corrupto, controlado pelo narco-fascismo fujimorista. Uma feroz disputa entre direitistas para ver quem é mais submisso ao sistema financeiro e aos cartéis estrangeiros; que se empenham na implantação da política neoliberal de desmonte do Estado, via ajuste fiscal, concessões-privatizações e reformas trabalhista e previdenciária.

A convite de movimentos sociais, estivemos no país andino debatendo com lideranças sindicais, estudantis e partidárias sobre a luta anti-imperialista que nos irmana. De viva voz, colhemos denúncias de assédios, perseguições e crimes contra os direitos humanos que vêm sendo praticados, o que - entre outros retrocessos - implicou na redução do índice de sindicalização a míseros 6%. Somente a Federação dos Trabalhadores da Construção Civil reportou o assassinato de 16 dirigentes desde 2011.

A cidade portuária de Callao, na região metropolitana de Lima, merece atenção pela íntima relação com o pó branco – já que o país seria atualmente, de acordo com a ONU, o segundo maior produtor mundial de cocaína - e pelo risco de vida que tem corrido os sindicalistas. Ali, em 2013, em um armazém de Kenji Fujimori, filho de Alberto, irmão de Keiko e também deputado fujimorista, foram encontrados 100 quilos de cocaína. Descoberto, Kenji culpou a companhia de navegação a quem alugava a propriedade. Casualmente, no local, apenas em 2016, foram massacradas a tiros três lideranças sindicais. O cuidado com a nossa segurança refletia os riscos diante da impunidade reinante.
Juan Sotomayor, prefeito de Callao, carimba este tsunami, mantendo sob seu tacão o judiciário e a mídia. Conforme denunciou o programa “Panorama”, do Canal 5, nos últimos três anos, Sotomayor desviou US$ 15 milhões de recursos públicos da empresa de limpeza da cidade para o pagamento de funcionários fantasmas. Sua “planilha secreta” contém mais de 400 pessoas, que se alternam em “afazeres” mercenários. O principal é ser tropa de choque na luta contra os trabalhadores, em particular contra o Sindicato representativo do setor da limpeza, categoria cujos empregados recebem pouco mais de um salário mínimo (cerca de US$ 240) e são forçados a suar nos sábados e domingos sem qualquer compensação.
A fim de garantir que a opinião pública se mantenha distante dos fatos, o prefeito distribui a jornalistas e radialistas um “cala-boca” mensal variável entre US$ 1.500 e US$ 3.000. Para sustentar as viagens internacionais e as festas nababescas do chefe, conforme denunciou o jornal Maretazo Chalaco, os fiscais da prefeitura não poupam ninguém, atuando até mesmo como cafetões nos prostíbulos.
“Ao mesmo tempo em que em Callao os salários estão congelados e as condições de trabalho são deploráveis, o clima é de permanente amedrontamento”, assinala a secretária-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Rosa Carpio Palma. “Somos vítimas de pacientes, ameaçados e agredidos porque os centros de saúde estão desabastecidos e não há como atender a população. Além disso, companheiros têm sido assassinados por exercerem suas atividades de representação”, sublinhou.
Terrorismo 

“O fato é que a política econômica neoliberal reproduz um modelo que, amparado na delinquência, reforça a desigualdade e o terror na sociedade”, afirmou Max del Maso, dirigente nacional da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), frisando que “quem dirige politicamente o governo peruano é o narcotráfico”. “Os congressistas são financiados pela droga, pela lavagem de dinheiro das mais de 50 universidades privadas que controlam e pelos meios de comunicação com os quais contaminam a sociedade. O que temos hoje no país é um lixo televisivo que atua para alienar, para tornar nossa população presa fácil das receitas do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional”, acrescentou Max.
A Federação Nacional de Trabalhadores Administrativos do Setor Educacional (Fentase) esclarece que “primeiro veio o fujishock, com que Fujimori aplicou sua política nefasta de destruição do país e do sindicalismo classista, fechando 2.530 entidades, acabando com o sistema de pensões e com a remuneração de 30% para a preparação das aulas; depois, a promulgação da neoliberal Lei Servir, por Ollanta Humala, em 2013, quando os direitos sociais e trabalhistas dos servidores viraram letra morta”. “A Lei Servir não poupou ninguém de seus abusos: viúvas, órfãos, gestantes, doentes terminais”, sublinhou.
Na avaliação de Verónica Mendoza, líder da oposição, e do recém-criado Movimento Novo Peru, uma questão chave para quem deseja ser governo é perceber que as coisas não passam somente pela tomada do poder, mas pelo fortalecimento e ampliação de instrumentos de pressão social. “É muito importante que as pessoas estejam organizadas, conscientes, mobilizadas, que estendam seus laços de solidariedade, como começa a ocorrer no sul do país”, explicou, apontando exemplos como a defesa de uma política integral e sustentável da água, confrontando a odiosa contaminação provocada pelas transnacionais mineiras. Ao mesmo tempo, assinalou Verónica, “temos que garantir o prosseguimento do projeto do gasoduto e do polo petroquímico, para desenvolver nossa indústria e gerar emprego e renda”. “Para construir nosso Movimento, convocamos os cidadãos, as organizações sociais, sindicais e a outras forças políticas para que somem forças. Basta de indiferença e violência! É hora de fazermos escutar nossa voz!”, concluiu.

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